101.
obatian, você fez 101 esse ano. eu lamento que tenha vivido trancada em casa vendo quase nada a família desde os 100 anos, mas agradeço que a gente teve chance de fazer um festão de 100 pra você ano passado.
100 anos andando pra lá e pra cá, viajando, nadando e dançando, com os cabelos pretinhos e cozinhando pra família toda aos domingos.
quanta vida, né, obatian? quantas viagens você pode fazer com as amigas velhinhas, que bom que você foi visitar o Japão com 80 anos, depois de 70 anos nessas terras aqui, que bom que depois dos 80 anos você ainda tinha a turma da natação, da ginástica, da igreja (budista) e da dança. que vida linda.
eu só acho mesmo uma pena que eu tenha perdido a chance de conversar com você sobre racismo e machismo enquanto você ouvia e enquanto a língua não era uma barreira entre nós. teria sido uma troca incrível poder te explicar por que eu não alisava o cabelo da minha filha (e nem o meu), que meus filhos são negros, sim (e não mulatos clarinhos) e que tá tudo bem comigo sem ter mais marido (tive vários, não tive?) e vivendo sozinha.
mas ainda assim você foi muito prafrentex dentro do que você viveu. muito mais agilizada que meu avô pra sustentar (financeiramente) e organizar a casa, super independente, super bem informada, super tudo. dona da poha toda. e ainda sua filha foi a única da prole a sair da roça e vir fazer faculdade na capital, e sei que você tava lá empurrando minha mãe pra tudo isso.
de você, eu sempre vou lembrar da bagunça que eu fazia com minha irmã na sua casa (bagunça que nossos 5 filhos continuaram a fazer), dos sukiyakis, dos oniguiris, dos campeonatos de sumô na TV e de quando você me pediu pra viajar de navio e visitar o Rio com 90 anos. que bom que eu te levei.
hoje tiramos uma selfie e você olhou os cabelos brancos e me disse que até os 100 eles eram pretos. que só com 100 anos você ficou velha e parou de tingir. e é assim mesmo que me lembro de você: como alguém que só ficou velhinha quando fez 100 anos.
Que texto lindo! Minha mãe tem 81 anos e é super ativa e motivada. Quero seguir esse exemplo e quando minha filha chegar, quero que o exemplo da vó que está passando para a mãe continue. Já que o que é bom tem que ser compartilhado e seguido. Orgulho de todas as idosas que são mais jovens que tantos jovens que já nascem idosos.
Beijos.
Obs. Estava sentindo falta dos seus textos.
Viviane Garcia