– Mamãe, vem logo, que eu e o Isaac fizemos xixi na cama.
Na verdade, estávamos todos em barracas, então nos poucos segundos que levei para sair da minha barraca e abaixar na frente da barraca deles fiquei me perguntando o que poderia ser pior do que lidar com duas crianças, dois sacos de dormir e dois isolantes cheios de xixi. Quando abri o zíper, achei algo pior: duas crianças alagadas dentro de uma barraca.
Choveu muito aquela madrugada, um temporal gigante. Como eu dormi seca e confortável, nem me ocorreu que a barraca deles pudesse alagar. Não foi pouca água. Eles acordaram encharcados, com dedinhos enrugados, e tinha pocinhas de água de chuva no fundo da barraca. Aí eu perguntei:
– Mas ninguém avisou a mamãe que estava molhando tudo?
– Eu avisei, mamãe. Eu disse que estava chovendo.
É, Ruth, verdade. No meio da chuva, você me chamou da sua barraca e me disse “mamãe, está chovendo”. E eu respondi “sim, está chovendo” e você voltou a dormir. Você não me disse especificamente que estava chovendo DENTRO DA BARRACA.
Quando vi aquilo, não tive dúvidas: banho quente nos dois para esquentar e início do processo de desmontar todo acampamento para voltar correndo para São Paulo e passar o resto do feriado embaixo das cobertas chorando. Quando eles perceberam que meu plano era sair correndo dali, ficaram desesperados.
– Não! Não! Não! Vamos secar tudo e ficar aqui!
Eu nem tinha alagado dentro da barraca e só pensava em sair dali. Na verdade, eu preferia ter alagado do que ter dormido confortavelmente enquanto meus filhos estavam mergulhados em água fria. A previsão era sol o dia todo e eles queriam praia. Ficamos. Foi ótimo, tudo secou, dormimos mais uma noite (sem chuva). E na volta para São Paulo, comprei rapidinho uma barraca nova para evitar novos alagamentos. Isaac e Ruth foram mais guerreiros que eu.
Acampar tem perrengues, mas é muito amor.
Eu acampei a primeira vez aos 18 anos com uma amiga de infância e nunca mais parei. Depois que casei pela segunda vez e juntamos as barracas, ou seja, encontrei um parceiro que topou apresentar campings para crianças pequenas, temos acampado cada vez.
Eu sei que nem todo mundo gosta ou tem vontade de experimentar. Sim, é desconfortável, o chão é sempre duro, o pé fica sempre sujo, a barraca é apertada, o sol nasce às 6h e fica um forno dentro da barraca. Mas acho uma experiência fantástica para crianças e acho que super bacana fazer isso por elas.
Em campings acordamos junto com o sol, por causa do calor e da claridade. Principalmente se estiver calor, somos obrigados a sair da barraca imediatamente para não morrermos cozidos. Isso nos faz sair ao ar livre e curtir o ar livre: sol, ventinho na cara, grama. Acordar cedo nos faz aproveitar mais o dia. Como dificilmente dá vontade de entrar na barraca antes do anoitecer, tudo acontece ao ar livre: as refeições, o deitar na grama para ler e descansar, as brincadeiras. Não tem TV, não tem preguiça no sofá. Tem lugar para correr, grama ou areia para brincar, pé descalço o tempo todo.
O fato de termos que nos adaptar a algo não tão confortável como nosso quarto também é um aprendizado para as crianças. Meus filhos têm sacos de dormir e isolantes térmicos e dormem com eles no piso da barraca, assim como nós. Não levo edredons, colchonetes, travesseiros de casa, colchões infláveis, porque se um dia formos fazer uma viagem com camping mais “selvagem” é assim que vai ser. Não é que eu ame dormir no piso duro, mas existem destinos onde a única opção é essa. Recentemente escalamos o Monte Roraima na Venezuela (sem eles) e a única opção eram barracas. Alguém que não tope acampar nunca vai brincar de Mr. Fredricksen e conhecer o Paraíso das Cachoeiras.
Em geral, não dá para levar supérfluos para o camping. De novo, não quer dizer que eu não goste dessas coisas. Mas não dá para levar equipamentos eletrônicos (porque nem sempre tem tomada e agora aprendi que sempre podemos alagar e perder tudo), maquiagem, todos os cosméticos, um monte de troca de roupas. Na nécessaire, levamos apenas protetor, repelente, xampu, sabonete, pasta e escova de dentes. E aí vemos que tudo bem não secar o cabelo, não usar anti-rugas e não fazer maquiagem, e que as fotos ficam lindas do mesmo jeito.
Além disso, acampar com crianças é praticamente brincar de casinha. Sempre levamos coisas para fazer todas as refeições no próprio camping, o que é mais barato, mais prático porque economizamos todos os processos de comer fora com crianças e mais saudável. Preparamos a comida juntos no fogareiro e usamos uma mesinha desmontável para comer. Eu levo industrializados porque precisamos de coisas práticas, mas nunca sirvo “besteiras” para eles, nem acampando. Levo arroz em saquinhos, feijão/ grão de bico/ lentilha já cozidos em caixinha (já vêm temperados e não têm muitos conservantes), carne vegetal em lata, legumes em lata, spaghetti bem fininho para cozinhar rápido, molho de tomate pronto (escolho sem conservantes e sem glutamato monossódico), pães, frutas, bebidas e petiscos. Uma vez fomos fazer um passeio no parque nacional da Serra da Bocaina e levamos coisas para fazer o almoço porque esperávamos encontrar uma área de picnic por lá. Mas, não. Era proibido comer dentro do parque e não tinha nenhuma mesinha para fazer isso. Como a trilha tinha sido longa e o camping estava longe, resolvemos não matar as crianças de fome: sentamos na grama no estacionamento, preparamos um macarrão ali mesmo e eles comeram segurando pratinho em uma mão e colher na outra. Uma fofura.
E, por fim, é barato. Acabei de fechar um pacote para dois adultos, duas crianças e um cachorro para o próximo feriado de três dias por R$ 220. Nosso plano de viajar todos os feriados do ano leva em conta um monte de campings que queremos conhecer com as crianças. Mesmo que você precise comprar barraca para acampar a primeira vez vai sair mais barato que pagar o hotel (e barraca é um investimento para anos. Essa barraca que alagou viveu mais de 10 anos antes do desastre).
Bora?