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Isso me mata

Criança gosta de Galinha Pintadinha, de Frozen, da Peppa. Já teve a época dos Backyardigans e Charlie e Lola. Tem o Ben 10, as Princesas da Disney e várias animações que fazem sucesso. E existem vários outros programas infantis que não conheço – porque sou uma pessoa alienada que não tem TV paga nem aberta em casa – e que fazem a alegria das crianças.

Ao mesmo tempo, eu nunca ouvi uma criança dizendo que adora Breaking Bad, ou Law and Order Special Victims Unit, ou Game of Thrones, ou que nunca perde um capítulo de Verdades Secretas. Nunca conheci uma criança que tenha assistido Ninfomaníaca ou Cinquenta Tons de Cinza. O que me leva a afirmar uma coisa: os adultos têm noção do que são programas televisivos para adultos e o que são programas televisivos para crianças.

Esta afirmação me leva a uma grande indignação com a humanidade: por que, adultos do meu coração, vocês não aplicam o mesmo filtro para músicas? Por que? Não quero discutir gosto musical, de forma alguma, please, ouçam o que quiserem. Mas não achem normal ouvir criança cantando “prepara, que agora é a hora do show das poderosas que descem e rebolam”. Ou “delícia, delícia, assim você me mata, ai, se eu te pego”. Ou, ainda, “por que hoje eu quero te pegar gostoso”. E por aí vai.

Não acho que seja necessário gastar muitas palavras explicando por que as letras dessas músicas (e de algumas outras tantas que seguem a mesma “linha”) não são – nem um pouco – adequadas para crianças. Nem vou perder tempo. Se ainda o mundo estivesse desprovido de música boa, né? E olha que tem muita música “de adulto” que é ótima para criança. Mas muita mesmo. Tem até o hino do Palmeiras em último caso. Então, gente, por misericórdia, vamos filtrar os que as crianças ouvem. Vocês não podem estar falando sério que acham isso normal.

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Simplifica

Há mais de um ano eu só penso em trabalhar menos. Eu gosto de trabalhar, não nasci pra ficar em casa e cuidar dos filhos em tempo integral, mas justamente por causa deles eu quero trabalhar menos. Não sei quão menos, mas certamente bem longe do modelo CLT de 40 horas semanais. Oito horas por dia de segunda a sexta é tempo demais. Isaac e Ruth merecem mais de mim.

E o primeiro passo desse plano foi reconhecer que trabalhar menos significa ganhar menos. Pra ser justo, né? A não ser que eu ganhe na loteria, mas para isso eu precisaria jogar na loteria, e nunca jogo. Então a alternativa é ganhar menos. E, para ganhar menos e continuar a nos divertir, eu fiz um plano de simplificação da vida. Um plano de desapego.

Primeiro foi o carro. Eu tinha carro da empresa, mas os custos de combustível, estacionamento, multas e algumas manutenções eram meus. O stress do trânsito também era meu. Quando mudei para uma empresa que não tinha esse benefício, desapeguei. Deleite da minha planilha de controle de despesas as linhas: combustível, estacionamento, lavagem, multas, IPVA, seguro, manutenção.

Falta de carro me levou a desapegar dos sapatos de salto. Sapatilha custa um pouco menos que scarpin, mas o ponto aqui não é o custo. É a agilidade e a não preguiça. Quando a distância é curta, eu ando.

Depois foi a TV a cabo. Aquela que estava instalada na sala e no quarto e que nunca era acessada. Foi embora, coitada. Fiquei só com a Internet, o iTunes e a Netflix. TV em casa é só on demand, e o custo é menor.

Aí veio a mudança de casa, onde desapeguei de duas coisas em uma única tacada: a casa própria e o espaço extra. Vendemos nosso apartamento e fui morar com as crianças em um apartamento alugado que é 30% menor. Tem o espaço que precisamos e nada mais. Perdendo espaço, deixamos para trás as tralhas. Vendi e doei muita coisa. Não temos mais jogos imensos de pratos, talheres e taças, não tem eletrodoméstico encostado, não tem roupa que não usamos mais, não tenho mais 80 pares de sapatos, vendi grande parte dos livros, porque não cabe. Para comprar mais coisas, penso no que vou doar para caber. Tô mais leve.

O aluguel também me livrou de uma parcela do financiamento lotada de juros, de despesas extraordinárias do condomínio (sabem aquela reforma na academia que aprovam na reunião e que custa XXX reais por mês a mais no condomínio? eu não tenho nada a ver com isso), de alguns custos de manutenção que são responsabilidade do proprietário (infiltrações, por exemplo). Também nos deixou mais flexíveis para mudar de casa se precisarmos. Demorei um ano para vender o apartamento e fiquei um pouco traumatizada. Se para simplificar ainda mais eu quiser morar mais perto do trabalho um dia, é só agendar a mudança.

O desapego mais recente foi da empregada doméstica mensalista que vinha todos os dias. Trabalhando fora e com duas crianças, eu achei que não dava para viver sem. Achava ele iria me matar sem uma dessas. Mas não. Hoje temos só a babá e ajuda esporádica: sem nenhuma frequência definida (às vezes 7 dias, às vezes 10) eu chamo uma empresa de limpeza e pago por hora a limpeza pesada e passar roupas. O resto eu faço: arrumo as camas, mantenho a cozinha limpa, coloco as roupas para lavar, rego plantas. Eu, não, nós. Nessa história, as crianças ganharam responsabilidades de habitantes da casa: esticam o edredon de manhã e arrumam os bichinhos de pelúcia, levam a roupa suja no cesto, recolhem comida que cair no chão, ajudam com a roupa na máquina, guardam suas roupas e sapatos no lugar. Agora eles mesmos me falam: “a gente não tem mais ajuda e temos que deixar nossa casa limpa, né, mamãe?”. Isso. Eu também estou reaprendendo que, se deixar o tênis da academia na sala, ele vai estar lá quando eu voltar do trabalho. E também estou feliz por estar ensinando dois pimpolhos a serem bons roommates no futuro.

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O exemplo e o consumismo

Como todos os papais – biológicos ou adotantes – nós temos uma porção de valores que queremos passar para nossos bebês e uma outra porção de coisas que queremos ensinar para eles. Coisas que dizem muito sobre quem somos e tal. Coisas comuns como alimentação, sono e educação.

Alimentação foi o que mais tomou nosso tempo até agora. Primeiro gastamos um tempo tentando entender por que todas as pessoas do mundo – mesmo que tenham seus próprios filhos – têm um desejo incontrolável de dar porcaria para as crianças comerem. Nós sabemos que um dia nossos filhos vão provar e gostar de guloseimas e não vamos proibir totalmente. Mas hoje eles têm um ano e meio e podem viver sem refrigerante, batata frita, bala, bolacha recheada, salgadinho etc. Depois de muita irritação, entendemos que o dever de oferecer e ensinar a ter uma boa alimentação é dos papais e estamos nos esforçando para isso. Não tem papinha salgada industrializada em casa; o papai prepara o arroz, feijão, lentilha, legumes, carne, frango, sopa, macarrão e tudo mais para as refeições em casa e eles podem comer alguma coisa do cardápio quando vamos a restaurantes. Também não temos guloseimas e a papinha doce é servida só na rua; em casa comem quatro porções de fruta na sobremesa e nos lanches, todos os dias. E não são coitadinhos porque comem só fruta. A hora da fruta é quando mais nos divertimos na cozinha: canto para eles enquanto lavo, descasco e corto e muitas vezes os deixo comer as frutas sozinhos – o que é uma farra e uma sujeira! Recentemente, durante a pesquisa de escolinhas para o ano que vem, desistimos de uma que era ótima em vários quesitos (localização, instalações, parte pedagógica, preço) porque eles só oferecem suco em pó ou concentrado – e achei muita preguiça não fazer suco natural para as crianças.

Televisão foi outra preocupação. Nas primeiras três semanas, eles não assistiram televisão porque eu não costumo ligar a televisão se não for assistir alguma coisa específica. Depois ganharam DVDs da Galinha Pintadinha, Pequerruchos e alguns outros e me rendi: passei a colocar para eles um pouquinho por dia e gostei. Mas até hoje não ligo em televisão aberta ou fechada para que vejam desenhos. Não porque eu não reconheça que alguns programas são educativos e divertidos, mas porque a quantidade de anúncios sobre brinquedos e guloseimas me incomoda. É impressionante como a questão em torno da publicidade infantil vira relevante quando nos tornamos papais. Eu quero conhecer os produtos infantis e decidir se são bons para meus bebês, mas gostaria que os anunciantes falassem diretamente comigo, e não com meus filhos. Hoje mesmo passei por um canal infantil na televisão fechada e vi o anúncio de um cachorro que fala por apenas “x” reais. Sem discutir a utilidade de um cachorro de pelúcia que fala, desde quando as crianças precisam saber o preço do brinquedo ou conseguem entender se o preço “x” é razoável para seus pais?

E, com a publicidade, vem a discussão sobre os brinquedos. Nós não queremos ser radicais. Nossos bebês terão brinquedos e ganharão presentes no aniversário, no dia das crianças e no Natal. Mas não terão brinquedos exagerados ou caros. E não queremos que eles fiquem possessivos com seus brinquedos, então em casa não há “brinquedo da menina” e “brinquedo do menino”. Os brinquedos ficam juntos e os dois brincam com o que quiserem. Eles têm duas motocas e geralmente brincam ao mesmo tempo, mas nunca dissemos que ela tem que usar a rosa e ele tem que usar a azul – eles escolhem a que preferirem. Esses dias vi uma boneca em uma loja de brinquedos que me deixou arrepiada. De medo. Era uma boneca quase “real”, que come, fala, faz um monte de outras coisas e faz cocô. Ao lado da boneca, havia pacotes de papinhas e fraldas vendidos separadamente, para repor as fraldas que a boneca sujar. Quase caí para trás. Depois de longas discussões sobre o uso de fraldas descartáveis ou fraldas de pano em nossos bebês, porque estávamos preocupados com o impacto no meio ambiente, eu nunca poderia imaginar que um adulto pudesse achar que é legal desenvolver, fabricar, anunciar ou comprar fraldas descartáveis para uma boneca.

Nós não queremos que eles cresçam achando que podem ter ou comprar coisas sem nenhum limite. Ou achando que serão melhores se tiverem tal roupa ou tal objeto. E para ensinar isto a eles, nós damos o exemplo: quando compramos nosso apartamento, não saímos comprando todos os móveis e objetos de decoração sem antes decidir se realmente precisávamos ou queríamos aquilo. Da mesma forma, não saímos comprando um enxoval novinho em folha para os dois, sem nem saber exatamente do que eles precisariam. Ao invés disso, nós recebemos doações de amigos queridos e depois entendemos as necessidades dos nossos filhos. Uma delas foi a mamadeira, que eles largaram quando vieram para cá, e teria sido um desperdício comprar todos os cacarecos que a acompanham (esterilizador, esponja para lavar, bolsa térmica para carregar etc.).

Seja alimentação, consumismo ou qualquer coisa que os papais queiram ensinar, o mais importante é dar o exemplo. Nós acreditamos que nossos bebês vão sempre comer bem porque nós mesmos sempre colocamos verduras, legumes e frutas em nossos pratos. E também acreditamos que não adianta voltar carregado de roupas e eletrônicos dos Estados Unidos, trocar o carro e o celular todo ano e querer que os filhos tenham uma infância livre de consumismo. De novo, não queremos ser radicais e sei que tenho mais sapatos do que preciso – só achamos que as crianças precisam ver coerência no que ensinamos para elas.

Depois que os brigadeirinhos chegaram, mudamos um pouco o foco de nossas leituras do “como se preparar para a adoção” para “os cuidados com o bebê” e encontramos o movimento Infância Livre de Consumismo. E decidimos apoiar. Apoiamos uma infância feliz, com carinho, brincadeiras, músicas, passeios e gargalhadas. Sem consumismo.

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