O amor e a adoção

“Infelizmente a opinião em não aceitar a adoção consensual e seguir apenas o CNA esbarra em 2 problemas. Primeiro, diz que a mãe biológica arrependo-se, pode pedir a criança de volta. Sim é verdade, da mesma forma que acontece se seguir o CNA. Ou seja é a mesma coisa, se não fosse assim, não haveria o grupo “Fica Duda” onde uma criança estava em processo de adoção pelo CNA e está sendo devolvida aos pais biológicos.

O segundo problema e mais grave de todos. Quando se adota uma criança, ela não vem com um papel em branco. Ou sofreu maus tratos, ou abusos, ou sua mãe é usuária de drogas ou de álcool. Enfim, quando se faz uma adoção consensual tem-se a chance de saber mais dessa criança, o seu passado e o da mãe. Nada pior que do que depois de anos, saber que a criança adotada tem um problema psiquiátrico ou mental, ou ainda distúrbios que não sabemos como lidar, adquirido ainda na forma fetal. Isso costuma ser comum em crianças de mães viciadas em crack.

Enfim, prefiro a consensual ao CNA por esses motivos.”

Recebi esse comentário de um leitor no post sobre adoção consensual e quis comentar o segundo ponto, mas a resposta ficou tão grande que acabou virando outro post. Vamos lá, então.

A adoção é justamente uma alternativa para as crianças que, infelizmente, não puderam ser acolhidas pela família biológica. E, sim, em geral os genitores tinham problemas com álcool, drogas, violência, negligência, maus tratos e uma série de coisas muito tristes, que os impediram de exercer plenamente o papel de papai ou mamãe. Então, sim, quando se adota uma criança, ela não vem com um papel em branco. Ela vem com uma história de vida que se iniciou antes de conhecer a família adotante. E isto faz parte da adoção.

Geralmente, nos processos de destituição de poder familiar, estão anexadas todas as informações sobre o passado dos genitores e da família biológica, as condições da gravidez e documentos médicos. É direito do adotante conhecer o passado de seu(sua) filho(a). Eu mesma pedi ao fórum que solicitasse ao hospital onde meus bebês nasceram todos os documentos referentes ao pré-natal, parto e cuidados dos dois após o nascimento, incluindo exames e medicamentos tomados, e fui atendida em poucos dias.

A adoção consensual não garante que a gravidez tenha sido livre de drogas, álcool ou mesmo maus tratos. A genitora que abre mão de seu filho e deseja o entregar a outra família também pode mentir. E o simples fato de ter sido entregue a outra família, independente das condições da gravidez, também pode gerar traumas futuros para a criança adotada. Não dá para prever. Também faz parte da adoção.

Eu ia dizer que, para estar totalmente livre desse tipo de “problema grave”, o melhor caminho seria uma gravidez, onde papai e mamãe podem acompanhar de perto todo o desenvolvimento da criança ainda na barriga e cuidar de tudo de pertinho. Mas conheço um mocinho de sete anos, filho biológico de seus pais, recentemente diagnosticado com um problema mental. Também conheço um rapaz que levou a esposa para um parto de emergência e o filho do casal nasceu com apenas seis meses de gestação, e é difícil prever o impacto disso no desenvolvimento da criança. Só estou trazendo esses exemplos para mostrar que nós nunca vamos conseguir garantir 100% que nossos filhos não terão problemas com os quais não sabemos lidar. Acontece. Faz parte do papel de mamãe e papai ser forte, erguer a cabeça, amar muito e enfrentar.

Pra falar a verdade, o que mais aprendi com a maternidade é que, independente da adoção ou gravidez, a gente passa a viver enfrentando situações com as quais não sabemos lidar. Todo dia, o tempo todo. Eu não sei lidar com birras, com desfralde, com filho que morde os amiguinhos, com criança doente, com a sensação de fracasso que tive quando assumi para mim mesma que precisava de ajuda com os bebês. Eu não sei se meus filhos terão alguma dificuldade de aprendizado no futuro, algum trauma ou algum tipo de problema que necessite de cuidados especiais. Eu não sei e minha melhor amiga, que tem uma filha biológica, também não tem como saber. E esperar esse futuro desconhecido faz parte do papel de mamãe e papai.

Adoção é amor, porque ter filhos é amor. A gente só tem certeza do amor. Nenhuma mamãe e nenhum papai consegue ter certeza de que os filhos não terão problemas, traumas ou distúrbios e todos torcem para que isto não aconteça. Mas ter filhos significa aprender, enfrentar, aceitar, criar e fazer de tudo para que eles tenham a melhor vida que podemos oferecer para eles. Não. Importa. O. Que. Aconteça. Com. Eles.

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7 pensamentos sobre “O amor e a adoção

  1. Glaucia disse:

    Muito bom ler suas palavras. Elas me acrescentam e fortalecem mais ainda minha convicção do caminho mais seguro, o CNA, do qual faremos parte, e entender que ADOÇÃO É AMOR. Abraço e que Deus te use sempre para abençoar vidas, assim como a minha.

  2. Greice disse:

    Ruri, acho que tu estavas muito inspirada ao escrever esse post. Todos precisam adotar os seus filhos, sejam biológicos ou adotivos, e felizmente em nenhuma das situações eles vem com um certificado de garantia de coisa alguma… e isso que nos faz aprender mais sobre a vida! Um beijão

  3. Olá, suas palavras muito me ajudaram a compreender melhor, o processo de adoção consensual. Minha situação é parecida com a do seu amigo, que foi citado no post.
    Concordo plenamente quando diz “Adoção é amor, porque ter filhos é amor. A gente só tem certeza do amor. Nenhuma mamãe e nenhum papai consegue ter certeza de que os filhos não terão problemas, traumas ou distúrbios e todos torcem para que isto não aconteça. Mas ter filhos significa aprender, enfrentar, aceitar, criar e fazer de tudo para que eles tenham a melhor vida que podemos oferecer para eles. Não importa o que Aconteça”.
    O coração de pai e mãe, biológicos ou de coração, só deve ter espaço para o amor.
    Vejo a adoção, como um gesto de amor ao próximo. Sou leiga no assunto, mas acho que não deveria ser tão burocrático. Sinto no meu coração um desejo imenso de ter um filho. Eu e meu marido, nos casamos novinhos, e hoje com quase dez anos de casados, ainda não conseguimos concretizar nosso sonho de ter um filho. Não estamos preocupados com a forma que virá. Biológico ou adotivo, o amaremos muito.

    Gostei muito do que escreveu. Um abraço grande! Feliz Páscoa para todos de sua casa. Deus conceda amor e muitas alegrias a toda sua família.

    Obrigada!
    Att.,
    Daiana

  4. Marcela disse:

    Espero conseguir a minha habilitação seu blog tem me incentivado e me ajudado. Penso extamente dessa forma como descreveu. Obrigada por dividir suas experiencias conosco!!

  5. Fernanda Oliveira Santos disse:

    Queria só tirar uma dúvida; sempre dizem que o maior problema da adoção consensual é o risco de ter que devolver o filho em caso de arrependimento da mãe biológica. Mas nesses casos, que estão ocorrendo aos montes pelo Brasil, de retirada da criança dos pais adotivos para devolver a família biológica todos os pais não estavam criteriosamente no CNA?? E mesmo assim crianças que passaram 2 ou 5 anos com uma família são arrancadas do seu referencial afetivo, em detrimento total ao que pregam de prioridade ao bem estar da criança. Estou chocada com esses casos, não imaginava que isso existia, e também fiquei extremamente desestimulada para uma adoção.

    • Ruri disse:

      Olá, Fernanda, como vai?
      Essas histórias são muito tristes mesmo, dá dor no coração e concordo que é uma crueldade com a criança.
      Mas acredito que em todos esses casos o processo de destituição do poder da família ainda não tinha sido totalmente julgado e/ ou ainda cabiam recursos.
      Quando adotei meus filhos, esse processo também não estava completo e havia ainda um risco – ainda que baixo – de a família biológica recorrer.
      Conheço algumas pessoas que só toparam iniciar o estágio de convivência (ou seja, levar a criança para casa) quando este processo estivesse completo – e isto é uma escolha que você pode fazer.
      Não fique desestimulada. Talvez o que você pode fazer é avisar o fórum onde está sendo habilitada que quer garantir que o processo seja concluído antes de iniciar a convivência. Adotar é bom demais, vale a pena!
      bjs
      Ruri

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