Mamãe estressada

Epílogo

Chegar a uma conclusão assim não foi um processo fácil e muitas vezes foi bastante doloroso. Eu achei que tinha falhado e que não era uma boa mãe inúmeras vezes. Eu achava tudo o que vou contar um absurdo. Mas hoje estou tranqüila e feliz com a decisão que tomei: contratei alguém para me ajudar com os bebês.

Fato

Eu escolhi uma carreira há mais de três anos da qual gosto muito: sou consultora. Nos quase três anos em que trabalhei em uma consultoria de estratégia, eu ficava no escritório umas 12 ou 13 horas por dia em média. Nunca conseguia jantar em casa. Mas, se por um lado parece desumano, por outro lado eu me divertia. Depois que virei mãe, passar as noites no escritório perdeu o sentido, claro. Eu trabalhei na empresa por três meses depois de voltar de licença maternidade, sempre saindo por volta das 18h para ficar com meus pequenos, o que me obrigava a mergulhar no trânsitodosinfernosdesãopaulotodosantodia, além de sempre ter que parar alguma coisa para sair correndo. Mudei de emprego, continuo consultora, parei de jantar no escritório ou levar tanto trabalho pra casa e por um tempo consegui estar às 19h todo dia na porta da escola para pegar meus bebês e levá-los para casa. Não sem antes enfrentar o trânsitodosinfernosdesãopaulo e chegar lá estressada demais.

Complicação

Eu juro que tenho um sentimento muito feio: eu morro de saudades do tempo em que eu podia ficar no escritório até tarde e que não fazia a menor ideia do que é o trânsito de São Paulo às 18h. Eu nunca queria ter conhecido a Bandeirantes nesse horário. Eu nunca queria ter descoberto que nenhum caminho alternativo às 18h funciona, nem nenhum aplicativo inteligente no IPhone. E eu realmente espero que apenas as pessoas que precisam buscar seus filhos na escola se joguem na rua nesse horário. Caso contrário, gente, não façam isso, não! Faz mal pra saúde!

O problema foi que, mesmo tendo aprendido que na maioria esmagadora das vezes eu consigo chegar na escola no horário certo, eu já começo a semana tensa. Toda segunda é dia de ficar olhando a agenda e me estressando com os horários das reuniões. A partir das 17h, todo dia, eu inicio o momento será-que-vou-conseguir-sair-às-18h e perco toda e qualquer atenção no que estou fazendo. Todo dia às 18h eu saio de onde estiver em São Paulo rumo à escolinha, chorando, mentalizando um calmaquevaidarprachegarnohorário. Todo dia pego meus filhos com cara de cansada e tensa e isso não é nem um pouco legal com crianças.

Eu odeio horários. Odeio horários porque sou uma pessoa maníaca que sempre chega adiantada, com medo de perder o horário ou com medo de deixar alguém me esperando. Eu chego 3 horas antes de vôos nacionais e sempre chego antes do paciente anterior quando tenho consulta médica. Odeio atrasar. Eu devia fazer terapia para isso, eu sei. Mas eu teria que marcar horário com uma terapeuta e isso iria me estressar mais ainda. Eu, por exemplo, pratico musculação e corrida não porque são coisas que eu ame fazer, mas porque são coisas que posso fazer em qualquer horário. Posso entrar na academia a hora que eu quiser e sair a hora que eu quiser e pronto. Spinning às 7h? Me dá calafrios. Aula de jump às 20h? Me enlouquece só de pensar.

Enfim.

Aí, saber que meus filhos estão me esperando na escola, cansados, depois de passar o dia todo lá, é a pior sensação do mundo. Ficar pensando que eu vou ser uma das últimas mamães ou papais a chegar lá e que as tias vão começar a apagar as luzes das salas que forem ficando vazias é agoniante. Ter consciência que eu passo um tempo com eles de péssima qualidade, porque eu demoro para me recuperar de todo o stress com horário e trânsito, me mata um pouquinho todo dia.

Para piorar, a escola começou a cobrar multa a cada 10 minutos de atraso.

Solução

Aí algumas pessoas me deram sugestões que parecem lindas, mas não se encaixam em mim.

1. “Por que você não abre um negócio?”: porque eu precisaria de uma ideia brilhante ou um talento muito grande (fazer cupcakes, fotografar, cortar o cabelo dos outros), mas eu não tenho nem um nem outro.

2. “Por que você não presta concurso público para ter uma vida mais tranquila?”: porque a maioria dos concursos com bons salários também exigem que você faça trabalhos burocráticos e repetitivos, tipo ficar checando se as pessoas pagaram direito seus impostos. Tem coisas bacanas e bem remuneradas, tipo ser juíza ou promotora, mas eu estudei engenharia. E também não consigo imaginar uma juíza dizendo: “vamos interromper esse julgamento agora, que tenho que buscar meu filho na escola”.

3. “Por que você não muda de casa?”: porque hoje os bebês amam a escolinha, meu filho faz fono do lado de casa com uma terapeuta que ele adora e estou relativamente perto de um vovô e de uma vovó. Mudar faria muito mais confusão em nossas vidas.

4. “Por que você não os coloca em uma escola perto do escritório?”: 1) porque nem sempre termino o dia no escritório – visito muitos clientes, 2) porque os bebês amam a escolinha atual, 3) porque se o trânsito já me estressa sozinha no carro ouvindo a música que quero, imagina o nível de stress de uma mamãe parada no trânsito durante 1 hora com dois bebês impacientes ouvindo Galinha Pintadinha? Socorro? Resposta séria: porque não acho justo que eles conheçam nosso trânsito infernal tão novinhos. Só por isso. Prefiro sofrer sozinha.

5. “Por que você não arruma um emprego que permita que você saia às 17h todo dia, para fazer alguma coisa bem legal, com o mesmo salário e benefícios que você tem hoje?”: que emprego é esse, gente? Alguém encaminha meu CV?

7. “Por que você não pára de trabalhar?”: só se eu puder parar de pagar minhas contas também. Tem como?

Todo dia eu invejo as pessoas que moram em cidades fofas, onde o transporte público funciona bem e chega em todos os lugares e onde as pessoas andam pra lá e pra cá de bicicleta sem medo de morrerem atropeladas por um motorista maluco. Sério. Seria lindo. Mas como eu moro, trabalho e crio duas crianças em São Paulo, precisei pensar em soluções realistas: contratei a perua da escola para que eles voltem para casa e uma pessoa que esteja em casa todos os dias quando eles chegarem aqui. Não tenho um super orgulho disso. Nunca quis ter uma babá. Mas é a forma como acho que nossa vida vai funcionar melhor.

Na prática, a rotina não deve mudar muito. Eles vão chegar em casa por volta das 19h, horário em que eu os buscava na escola. Eu vou continuar saindo cedo para ficar com os dois à noite, mas sem aquela preocupação horripilante com atrasos, pois eles estarão tranquila e confortavelmente me esperando dentro de casa. Vamos tomar banho juntos, tomar leite juntos e ir para cama juntos todos os dias. A única diferença é que mamãe não vai ter passado 1 hora xingando o trânsito, a chuva, a cidade, e vai estar muito mais calma e emocionalmente disponível para eles.

Hoje eles vieram de perua para casa pela primeira vez e eu estava esperando-os aqui junto com a Cleide. O tio da perua me disse que a professora contou que eles falaram na tal da perua o dia inteirinho. Chegaram felizes com a novidade e o coração da mamãe ficou bem mais tranquilo.

PS: uma amiga comentou que esse post está caótico demais. Gostei do feedback. Acho então que eu consegui transmitir exatamente o que buscar-na-escola-todo-dia-às-19h me causa: caos! 🙂

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7 pensamentos sobre “Mamãe estressada

  1. […] para o mundo depois que eles vão para a cama. Chegar tarde para vê-los dói, como contei aqui. E, por serem prioridade e as coisinhas mais importantes da minha vida, eu tive que colocar alguns […]

  2. […] doente, com a sensação de fracasso que tive quando assumi para mim mesma que precisava de ajuda com os bebês. Eu não sei se meus filhos terão alguma dificuldade de aprendizado no futuro, algum […]

  3. […] todo dia às 19h era humanamente impossível para mim. Essa parte da história já contei por aqui. A verdade é que eu resisti muito. Eu achava que qualquer pessoa que tinha uma babá na vida era […]

  4. […] um tempo atrás, escrevi aqui no blog que o transporte público em São Paulo não funcionava e que eu invejava pessoas que […]

  5. […] o máximo que eu podia ficar no escritório para chegar na escola no horário certo e já contei aqui, aqui e aqui como esse processo todo me […]

  6. […] ambiente corporativo, do quanto é duro equilibrar todas as demandas, da dificuldade de cumprir os horários, da cobrança por parecer não fazer nada […]

  7. […] que não era boa nem em uma coisa, nem em outra. Alguns textos meus sobre este item aqui, aqui, aqui, aqui e […]

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